ATENÇÃO

TODOS OS TEXTOS AQUI POSTADOS POSSUEM COMPROVAÇÃO DE AUTORIA!
"É isso: tudo está ao alcance do homem e tudo lhe escapa, em virtude de sua covardia... Já virou até axioma. Coisa curiosa a observar-se: que é que os homens temem, acima de tudo? 'O que for capaz de mudar-lhe os hábitos': eis o que mais apavora..."

Dostoiévski

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Briografia: Camilo Castelo Branco

VIDA E OBRA: CAMILO CASTELO BRANCO

Camilo Castelo Branco foi um escritor português pertencente à escola romântica. Nasceu em Lisboa, em 16 de março de 1825. A vida e a obra deste autor estão intimamente ligadas: esta é o reflexo das tragédias que marcavam aquela. Bastardo e órfão, casou-se cedo e viveu amores proibidos. Foi o primeiro escritor português que ousou viver dos frutos de sua literatura, o que o fez escrever uma grande quantidade de livros. Em 1890, fragilizado pela crescente cegueira e pelas tragédias vividas, Camilo comete suicídio.

A obra de Camilo é marcada pela forte imaginação. Seus textos mais conhecidos são as novelas passionais, como Amor de Perdição e A doida do Candal. Estas atendiam ao gosto do grande público consumidor, atuante no Romantismo. Nelas, os amantes, geralmente jovens, viviam um amor puro, porém impedido por algum fator familiar ou social. A abnegação os santificava, tornando-os verdadeiros heróis. O final trágico era a punição pelo desejo de um amor imaculado em uma sociedade corrupta.

Suas melhores obras, porém, são as de cunho satírico e tom realista. É o caso de A queda dum anjo e A brasileira de Prazins. Nestas obras, diferentemente das novelas passionais, o sentido trágico está na conformidade com a convenção que, antes, era inaceitável. O protagonista não é mais um herói, santificado pela pureza do amor, mas um indivíduo que se deixa corromper pela sociedade que repudiava.

O trágico é “o ponto para o qual converge toda a produção literária de Camilo, por mais diversificada que seja”[1]. A união entre imaginação e a realidade observada e o excelente trabalho com conceitos e linguagem dão à obra camiliana seus aspectos de grandeza.



[1] MOISÉS, Massaud (Dir.). A Literatura Portuguesa em Perspectiva: Romantismo e Realismo. São Paulo: Atlas, 1994, p.70.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Biografia

Gil Vicente

A figura de Gil Vicente é uma das mais importantes da Literatura Portuguesa. O teatro vicentino surgiu e se desenvolveu no contexto do Renascimento Português. A identificação do homem que consagrou o teatro popular, porém, não é exata. Suas obras foram publicadas postumamente por Luis Vicente, seu filho. O que se afirma sobre Gil Vicente é: nasceu por volta de 1465; encenou sua primeira peça em 1502; foi colaborador no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende e organizador das festas palacianas. Seu último auto data de 1536.

A obra vicentina é composta de peças curtas que abordam problemas comuns à sociedade da época, como a ambição, a avareza, a injustiça, dentre outros. Essas peças são conhecidas como autos. Suas personagens são, geralmente, tipos característicos da sociedade. Segundo Saraiva,

(...) o tipo mais insistentemente observado e satirizado é o clérigo, e especialmente o frade. (...) Gil Vicente censura no clérigo a desconformidade entre os actos e os ideais, pois, em lugar de praticar a austeridade, a pobreza e a renúncia ao mundo, busca a riqueza e os prazeres.

(SARAIVA, s/d: 197)

Uma de suas peças mais famosas é o Auto da Barca do Inferno. Nesta obra, Gil Vicente reúne diversos tipos sociais e critica seus atos em vida. Todas as personagens estão mortas e, uma a uma, chegam a uma praia, na qual se encontram duas barcas: a Barca do Inferno, e a barca que leva ao céu. Todas pretendem embarcar em direção ao céu, mas a maioria acaba se resignando e aceitando a Barca do Inferno. Isso porque o Diabo lista com prazer os maus feitos da vida de cada um, convencendo-os de que não merecem o céu. Alguns dos tipos citados no Auto da Barca do Inferno são o Fidalgo, o Onzeneiro, o Frade, o Parvo, a Alcoviteira, os Cavaleiros e o Lavrador.

O teatro vicentino é carregado de comicidade, o que ameniza o peso de seu caráter crítico. Dessa forma, Gil Vicente conseguiu alcançar o gosto da nobreza e do povo, fixando-se como um dos grandes nomes de Portugal.

REFERÊNCIAS BILBIOGRÁFICAS:

SARAIVA, António José & LOPES, Óscar. História da literatura portuguesa. Porto: Porto Editora, s/d.

VICENTE, Gil. O Velho da Horta, Auto da Barca do Inferno e Farsa de Inês Pereira. São Paulo: Brasiliense, 1967.

domingo, 5 de abril de 2009

Biografia de Agatha Christie

Christie

Biografia:

Agatha Mary Clarissa Miller nasceu em 15 de setembro de 1890, em Torquay, Inglaterra. Era a filha mais nova de um abastado casal que vivia de posses, ou seja, não trabalhava. Desde pequena, a menina revelou sua genialidade, pois alfabetizou-se sozinha aos 4 anos de idade. Segundo a própria Agatha, ela via as sílabas e palavras e decorava-as, ligando-as a sua representação sonora; depois, quando via aquele símbolo outra vez, sabia exatamente o que significava.

Durante a 1ª Guerra Mundial, trabalhou como enermeira. Ao fim da guerra, escreveu seu primeiro romance, O misterioso caso de Styles, publicado em 1918, quando tinha trinta anos. Em 1914, casou-se com o coronel Archibald Christie e adotou o nome do marido para formar seu nome artístico. Surgia Agatha Christie.

Por volta de 1928, sua vida tomou um rumo mais triste.Além do falecimento da mãe, Agatha teve que conviver com o abandono do marido, que foi viver com uma amante. A escritora entrou em estado de choque e desapareceu. Durante doze dias toda a Inglaterra procurou por ela sem êxito. Quando o marido já estava quase sendo acusado de seu assassinato, foi encontrada em um hotel, em Marrogate, hospedada com o nome da tal amante. A autora justificou o episódio alegando um colapso nervoso.

A partir daí, passou a escrever para sustentar a si e à filha. Casou-se novamente, anos mais tarde, com o arqueólogo inglês Sir Max Mallowan, e passou a viajar com ele para várias partes do mundo. Dessas viagens surgiram temas para vários de seus livros, tais como Morte no Nilo, Mistério no Caribe, etc.. Em 1971, recebeu título de Dama da Ordem do Império Britânico.

Agatha morreu em 12 de janeiro de 1976, aos 85 anos, em Winterbrook, próximo a Oxford. Foi enterrada no cemitério da Paróquia de St. Mary, em Cholsey, Oxon. Publicou mais de 80 livros nos seus 55 anos de carreira. Sua única filha, Rosalind Hicks, morreu em 2004, também aos 85 nos. Seus direitos autorais pertencem ao neto, Matheu Pichard.

Agatha é uma das autoras mais publicadas do mundo, ultrapassada apenas pela Bíblia.

A obra:

Como já foi dito, Agatha se destacou de tal forma na escrita de contos e romances policiais, que ficou conhecida mundialmente como a rainha do romance policial. A maestria da inglesa nesse gênero pode ser atribuída, dentre outros aspectos, ao raciocínio lógico de suas tramas. Agatha sempre gostou de matemática e adorava resolver enigmas. Fazia de suas narrativas verdadeiros desafios para o leitor.

Quando interrogada sobre a estrutura de seus romances, a autora confessou que escrevia primeiro a cena do crime e, depois, redigia o todo, salpicando pelo enredo pistas falsas e verdadeiras. O resultado é um engenhoso quebra-cabeças, de resultados imprevisíveis.

Várias de suas obras foram adaptadas para o cinema e o teatro. É o caso de Assassinato no Expresso do Oriente e A ratoeira (peça com maior tempo de duração no teatro, de 1952 até hoje, baseada no conto Os três ratos cegos). Dentre as obras mais conhecidas da escritora, estão O caso dos dez negrinhos, A maldição do espelho, O assassinato de Roger Ackroyd, A testemunha ocular do crime, Passe de mágica, O mistério dos sete relógios e Convite para um homicídio.

Os personagens mais famosos de Agatha são Hercule Poirot – um detetive belga vaidoso, metódico e com um excelente raciocínio lógico – e Miss Marple – uma velhinha simpática e enxerida, que adora resolver assassinatos. Embora, em muitas de suas obras, Agatha utilize mortes por facadas ou tiros, suas preferidas são as por envenenamento. Para ela, o veneno tem uma magia que seduz o ser humano.

Seus últimos livros, um crime adormecido (1944) e Autobiografia (1977), foram publicados postumamente.

Essa foi a vida e a obra de uma mulher surpreendente, capaz de superar as maiores dores e de criar tramas sinistras e indecifráveis. Agatha Christie fez mais que escrever. Deixou-nos um bem: uma extensa coletânea de obras não só inteligentes, mas deliciosas. Não é à toa que foi e é denominada rainha.

“Passamos pela vida como um trem que se precipita, através da escuridão, a um destino desconhecido” (Agatha Christie)

“Eu as invento. Eles são meus. Tem de ser as minhas personagens. (...) Eu as tornei reais.”( Agatha Christie)

Túmulo da escritora,
CASAR OU NÃO CASAR? EIS A QUESTÃO:
uma análise interpretativa das literaturas romântica e realista sob a temática do casamento

Paula Alves das Chagas


“Portanto, deixará o varão o seu pai e a sua mãe e apegar-se-á à sua mulher, e serão ambos uma carne.”
(Gênesis, 2:24)




Nos estudos literários, há uma grande preocupação em se estabelecer diferenças entre os períodos de criação. Quando falamos de Romantismo e Realismo, porém, as fronteiras são mais tênues, pois, segundo José de Nicola (NICOLA, 1998:128), “as características do início do Romantismo são praticamente opostas àquelas encontradas no final do movimento” e temos motivos para crer que exatamente essas características finais tenham sido a primeira aparição do Realismo na literatura.
É nessa pequena brecha entre um movimento e outro que vamos nos aventurar, fazendo uma análise interpretativa de alguns romances franceses pertencentes aos dois períodos supracitados
[1]. Nosso objetivo, portanto, é estabelecer, através da temática do casamento, semelhanças e diferenças entre os romances ditos românticos e os realistas e determinar que tipo de literatura fez a ponte entre os movimentos.
O Romantismo foi o período literário da exaltação do amor puro e da libertação através da união conjugal. O casamento, nos textos românticos, é a salvação dos heróis, o motivo pelo qual lutam e perecem. Desenvolve-se, assim, como o pilar do enredo, almejado, perseguido, necessitado. É por ele que o leitor aguarda após páginas e páginas de conflitos amorosos.
Mesmo que os “mocinhos” não subam ao altar, o autor do período romântico terá o cuidado de enfatizar a eterna durabilidade do sentimento sublime que nasceu entre os dois personagens. É o caso do romance A dama das Camélias, do escritor francês Alexandre Dumas Filho. Na obra, Marguerite, a mais bela cortesã da capital francesa, apaixona-se pelo estudante Armand e vê na sua união com ele a possibilidade de regeneração e reconstrução de sua vida. Dumas nos dá uma heroína ostentadora e apaixonada, uma pecadora redimida pelo poder do amor. Assim, pelas palavras da própria Marguerite, ela faz “desse amor a esperança, o sonho e o perdão” (DUMAS, 2003, p. 133) de sua vida.
Prova maior da redenção da prostituta é o sacrifício que faz em nome da honra de seu amado. Ao abdicar do amor de Armand para proteger o nome da família dele, ela atinge o ponto mais alto da nobreza romântica. “A senhora é uma nobre mulher” (DUMAS, 2003:133), afirma o pai do rapaz após conseguir a separação dos amantes.
No romance de Dumas Filho, a tão esperada união não se concretiza de forma marcada. O autor prefere se valer de outro artifício, negando à sua prostituta qualquer possibilidade de felicidade em vida. Marguerite adoece e morre, levando consigo o sentimento que a elevou. A descoberta do real motivo de sua separação faz com que Armand definhe de tristeza, punindo-se por não haver acreditado até as últimas conseqüências na pureza de sua amada.
A promessa do final feliz não se cumpre neste romance, mas o amor, esse permanece intocável, imortal. Apesar de não conseguir resistir às convenções sociais, é mais forte que a própria morte.
O “vilão”, na obra citada, não se apresenta na forma de um personagem, mas na sociedade como um todo. As convenções sociais são o empecilho para a concretização do almejado casamento, como nos mostra Adilson Citelli, ao afirmar que “no romantismo a tensão aparece relacionada diretamente com o mundo, com os preconceitos de uma ética coletiva” (CITELLI, 2004:45). Logo, a união de Marguerite e Armand não é possível diante das convenções morais de seu ambiente social.
A idealização da vida a dois, do entusiasmo da relação amorosa, é mantida por anos a fio nos romances. Porém, pouco mais tarde, surge na literatura uma visão muito mais crítica sobre o amor. É Balzac que traz a público, em A mulher de trinta anos, uma heroína às avessas, cuja infelicidade provém exatamente daquele que deveria ser o objetivo-mor da protagonista romântica – o casamento. Ao contrário dos autores de sua época, Balzac preocupa-se em mostrar uma relação sem obstáculos para a concretização do casório. Sua protagonista apaixona-se e une-se a Vitor D’Aiglemont sem empecilhos. Aí é que se encontra a grande inovação do escritor: os conflitos da trama têm início justamente após o “felizes para sempre”.
Júlia D’Aiglemont sente-se insatisfeita com o casamento e chega a desejar jamais ter subido ao altar. Tudo porque não encontra na relação a dois o furor e a promessa de felicidade eterna. Pelo contrário, sente-se explorada e abandonada pelo marido e pela sociedade. O casamento perde, em Balzac, o significado que tinha em Dumas e Hugo, passando a ser visto como mera convenção social, que privilegia o homem e sufoca a mulher. Essa visão fica bem marcada nas seguintes palavras da protagonista:

O casamento, essa instituição sobre a qual se apóia hoje a sociedade, só a nós faz sentir todo o seu peso: para o homem a liberdade, para a mulher, deveres. Devemos consagrar a eles toda a nossa vida, eles nos consagram raros instantes. (BALZAC, 2004, p.83)

Mais a frente, a heroína manifesta uma opinião que vem quebrar completamente com a visão santificada da união conjugal: “O casamento, tal como hoje se pratica, parece-me ser uma prostituição legal.” (BALZAC, 2004, p.83). Ao comparar-se à prostituta, que vende seu corpo a luxúria do homem sem sentir por ele nenhum afeto, Júlia denuncia os costumes de sua época – mais explicitamente, o casamento. A “união sagrada” que seria a redenção de Marguerite torna-se a condenação de Júlia. Surge, então, uma nova promessa para a heroína romântica: o casamento por amor, a real concretização do sonho sublime da união terna e eterna.
Júlia, porém, encontra outros meios de se satisfazer, entregando-se a paixões extraconjugais. Fazendo isso, ela pisa na instituição que, segundo Ronaldo Vainfas, “impôs-se definitivamente como um verdadeiro sacramento” (VAINFAS, 1992:31).
O ensejo dado por Balzac será, anos mais tarde, muito bem aproveitado por Gustave Flaubert, dando origem ao romance que seria considerado o marco inicial do realismo literário. Madame Bovary chega aos leitores desafiando a moral e a sociedade. Suas páginas, impregnadas de crítica social, chamam a atenção pela prosa minuciosamente elaborada. Flaubert consegue, após cerca de seis anos de trabalho, transpor para o papel a sociedade francesa de seu tempo.
Nada escapa a Flaubert. Ciência, religião, amor: tudo se mistura numa trama onde nada é suficientemente aprovável ou condenável. Através de sua personagem-título, Ema Bovary, o escritor traz à tona, novamente, o drama da mulher insatisfeita e ávida por paixão. Assim como Júlia D’Aiglemont, Ema deseja encontrar um amor verdadeiro e o busca fora do casamento. As tentativas frustradas a levam a uma medida extrema: o suicídio. Ao perceber que não poderia ser feliz em vida, ela se entrega ao encontro da morte.
A sociedade torna a fazer o papel de vilã em Madame Bovary e A mulher de trinta anos. Dessa vez, porém, ela não é o empecilho da união, mas as algemas que prendem a mocinha em um casamento infeliz. É o peso moral e social do casamento que impede a libertação de Júlia e Ema, dando origem à infelicidade de ambas.
Ema burla o casamento, fere a instituição social que a sufoca. É nela que o sonho romântico do casamento perfeito se esvai, e é exatamente por sonhar com um romance tão belo quanto o dos livros que lê que ela sofre e causa o sofrimento de seu marido.
Tomando o casamento como linha de análise, poderíamos dizer que a obra de Balzac é a transição entre a união perfeita do romantismo e a instituição decadente do realismo. O romance A mulher de trinta anos estaria em uma espécie de meio-termo entre os dois períodos, por apresentar características de ambos. Já Flaubert, inaugurador do realismo, situa bem as características do período em seu romance, sobretudo no que diz respeito ao matrimônio. Ao revelar os piores aspectos do casamento, ele quebra com a visão romântica, desfazendo a idealização do período anterior e, ao mesmo tempo, criticando-a. Constrói, assim, uma nova forma de pensar, uma nova heroína, e, por conseguinte, uma sociedade diferente para acolher a nova mulher que surge de sua literatura.
Nossa análise se prendeu a três obras da literatura francesa, o que traz certas limitações aos nossos resultados. Foi utilizado um único critério de análise – o comportamento da temática do casamento nas obras – e, por isso, cremos que seja necessário confrontar esses mesmos títulos em torno de outros critérios para confirmar a validade dos resultados obtidos. Talvez seja necessário um estudo mais profundo da literatura do século XVII para que tenhamos resultados mais precisos e possamos confirmar se o comportamento da obra balzaquiana é ou não exercido por outros autores da época.











Referências Bibliográficas


BALZAC, Honoré de. A mulher de trinta anos. Tradução: Pietro Nassetti. São
São Paulo: Martin Claret, 1992.
CITELLI, Adilson. Romantismo. São Paulo: Ática, 3ª ed., 2004.
FILHO, Alexandre Dumas. A Dama das Camélias. Adaptação: Carlos Heitor
Cony. São Paulo: Scipione, 2003.
FLAUBERT, Gustave. Madame Bovary. São Paulo: Abril, 1971.
NICOLA, José de. Literatura Brasileira: das origens aos nossos dias. São Paulo: Scipione, 1998.

VAINFAS, Ronaldo. Casamento, amor e desejo no ocidente cristão. São Paulo:
Ática, 1992.

[1] Os romances utilizados em nossa análise são: A dama das Camélias, de Alexandre Dumas Filho; A mulher de trinta anos, de Balzac e Madame Bovary, de Gustave Flaubert.

sábado, 4 de abril de 2009

Nas entrelinhas
(Paula Chagas)

Muitos acham que sou louco, mas a verdade é que os livros são, para mim, como pessoas. Alguns são enfadonhos; outros, apaixonantes. Mas todos têm algo a dizer.
Alguns deles têm mais a dizer do que aparentam. Estão impregnados de sua própria história. Seja num rasgo, numa data escrita à mão na primeira página, ou num trecho sublinhado, eles trazem marcas. É por isso que sempre fui apaixonado por sebos. São lugares mágicos que trazem, não só cultura e lazer, mas vida. Vidas que antes tiveram o prazer de manusear o mesmo livro a que hoje tenho acesso.
Sempre tive a mania de observar certos detalhes nos livros antes de comprá-los. Os meus preferidos são os com assinaturas, datas ou dedicatórias. Essas, então, me levam para longe. É como uma história paralela à do livro. Certa vez, no sebo de costume, encontrei algo que me chamou a atenção. Tratava-se de uma edição antiga de Love Story, de Eric Segal. Já havia lido esse livro e tinha, inclusive, uma outra edição dele em casa, mas um pequeno detalhe me fez levar aquele exemplar comigo. Uma dedicatória. Dizia o seguinte:
“ Joana: Sei que de nada adianta pedir que releve os meus erros, mas ainda a amo. A história desse livro me fez lembrar de nós dois. Você vai achar estranho quando chegar ao final. E estará certa, pois nenhum de nós morreu, aparentemente. Mas é através desse livro que venho lhe comunicar minha morte, pois fui eu quem morreu nessa história. Morri no dia em que você me deixou e continuarei morrendo a cada dia, até que a verdadeira morte me assalte. Seu amor era o que me mantinha vivo e, sem ele, sou apenas um pobre defunto abandonado.”
“Espero que se lembre de mim toda vez que vir este livro e que chore a minha morte quando puder.” Lucas.
Não preciso nem dizer o quanto fiquei aturdido com aquela declaração. Aquilo tomou conta de minha alma. Não se passava um só dia em que eu não pensasse nesse casal.
Eu precisava conhecer a história deles, mas não tinha meios. Foi por isso que comecei a inventar. Desenvolvi a imagem dos dois na minha mente, imaginei como se conheceram, o que viveram juntos, por que se separaram e o que aconteceu a eles depois daquela dedicatória. Imaginei a feição de Joana ao ler aquelas palavras, uma mistura de amor e mágoa. Tentei criar um final feliz, mas não consegui. Eles não podiam ficar juntos; ele já estava morto desde o dia da separação.
Tudo foi fluindo de uma forma mágica. Senti necessidade de registrar minhas “descobertas”. Criei um diário fictício para Joana, onde ela teria escrito toda a história, mas não deu certo. Eu queria mostrar a reação dela, vista por alguém de fora; vista por mim. Passei adiante o amor dos dois. Quando percebi, tinha escrito um livro.